A reportagem divulgada pelo jornal Cruzeiro do Sul na semana passada, sobre o início da escolarização do negro em Sorocaba, que teve a colaboração do místico João de Camargo, despertou lembranças em dois irmãos que estudaram na escola fundada por Nhô João. Conforme eles, o prédio ainda está em pé. Nos livros e registros sobre João de Camargo, há poucas informações sobre a escola, não sendo possível saber detalhes do funcionamento, como por exemplo se existiram dois prédios. De acordo com Claudinei Brito, administrador da Associação Espírita e Beneficente Capela do Senhor do Bonfim, conhecida como Capela de João de Camargo, é provável que tenha sido inaugurado inicialmente um prédio, na década de 1930, mas que teria sido desativado depois que a ex-esposa de João de Camargo, Escolástica do Espírito Santo, herdou parte do terreno do místico, justamente onde ficava a escola, que com o passar dos anos foi demolida. A instituição de ensino, então, teria mudado para o prédio anexo à igreja e permanecido, conforme registros, até pelo menos 1961. O local continua o mesmo até hoje.
José Luiz Negrão, 65 anos, e Domiciano Negrão, 64 anos, contam que frequentaram a Escola Mista da Água Vermelha, no prédio anexo à igreja. Em visita ao espaço, eles lembraram da professora, Ondina Campolim, da distribuição das carteiras, das travessuras e também dos castigos. "A dona Ondina vinha dar aula de charrete, algumas vezes nos escondíamos debaixo da ponte, esperávamos ela passar e aí a gente matava aula pra ir nadar", conta José.
Os dois estudaram ali porque a avó, dona Maria, morava em uma casa pertencente à Capela, onde hoje funciona o velário. "Nossa avó morava com o tio Lupércio. Ele tomava conta da capela, por isso residiam ali", diz Domiciano.
Marlene do Carmo Yoshino, 65 anos, prima de José e Domiciano, afirma ter ouvido falar que a primeira escola foi desmanchada depois da morte de João de Camargo. "Não tenho certeza quando iniciou a outra escola, mas também estudei lá em 1956."
Alzira Belini das Neves, 90 anos, mora há mais de 60 anos no terreno onde teria funcionado o primeiro prédio da Escola Mista da Água Vermelha. Dona Alzira disse que não chegou a ver a escola funcionando, mas é testemunha de que o prédio existiu. Ela conta que quando se mudou para lá, fazia oito anos que João de Camargo tinha falecido e a ex-esposa dele, Escolástica, morava ali.
José Carlos de Campos Sobrinho, o Zeca, co-autor juntamente com Adolfo Frioli do livro João de Camargo de Sorocaba - O nascimento de uma religião, publicado em 1999, afirma que "o correto é se fiar mesmo nos depoimentos orais". Conforme ele, o salão que fica anexo à Capela, à esquerda, é que foi apontado como sendo a escola, mas ele não chegou a conhecer a dona Alzira. "Documento acho que nem existe. Se eu tivesse ouvido outra informação naturalmente teria procurado. Essa é uma nova informação e acredito que outras podem surgir."
Baseado em suas pesquisas, Zeca afirma que pela atitude de ter fundado uma escola, João de Camargo foi citado em uma reportagem publicada no Diário Nacional de 27 de julho de 1930. Esse jornal carioca o apontou como um exemplo para a política educacional do País. Um negro, ex-escravo e analfabeto, dando mais importância ao ensino do que os órgãos públicos.
Zeca ainda lembra que este ano completam-se 100 anos que João de Camargo criou em sua igreja a Associação Espírita e Beneficente Capela do Senhor do Bonfim, que só foi reconhecida como pessoa jurídica em fevereiro de 1921. Este também é o centenário de fundação de outra iniciativa de João de Camargo, o Grupo Musical São Luís, que animava cordões carnavalescos de Sorocaba.
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